Mais vale auto-administrar-se um choque eléctrico do que ficar inactivo, considerou grande parte dos participantes num estudo de psicologia.
Meditar, sonhar acordado ou fazer introspecção durante alguns
minutos, sem fazer mais nada, é algo difícil para a maior parte das
pessoas, conclui um estudo norte-americano. Segundo os seus autores, a
mania dos ecrãs seria disso uma consequência e não uma causa.
Várias experiências
realizadas por psicólogos das universidades da Virgínia e de Harvard
(ambas nos EUA), e cujos resultados foram publicados na revista Science com
data desta sexta-feira, sugerem que a maior parte das pessoas prefere
antes desenvolver uma actividade qualquer – que até pode consistir em se
auto-aplicar ligeiros choques eléctricos – do que ficar a sós com os
seus pensamentos.
A equipa realizou 11 testes junto de públicos
diferentes – um pouco mais de 200 pessoas no total –, nomeadamente de
estudantes e de pessoas com 18 a 77 anos. Os voluntários foram
recrutados num mercado de rua e numa igreja. E em todos os casos
chegou-se "ao mesmo resultado”, segundo um comunicado.
A maior
parte das pessoas – a quem fora pedido para ficar sem fazer nada, numa
sala vazia ou em casa, e para pensar durante seis e 15 minutos –
declarou que a experiencia “não foi agradável e que teve dificuldades em
concentrar-se”.
Uma grande maioria teria preferido fazer qualquer coisa, tal como ouvir música ou utilizar o seu smartphone. E de facto, um terço dos participantes “fez batota”, ao consultar o seu telemóvel ou levantar-se da cadeira.
E
quando foi proposta como “actividade” a possibilidade de se
auto-administrarem ligeiros choques eléctricos – indolores e previamente
testado pelos psicólogos –, a maioria dos homens, mas não das mulheres,
preferiu esta alternativa à inacção.
Os autores não atribuem estes resultados ao turbilhão da vida moderna nem à utilização crescente de smartphones e outros gadgets electrónicos.
“Os utilizadores intensivos de telemóvel e de redes sociais não se
sentiram mais incomodados do que as pessoas que os utilizam com menos
frequência”, disse à agência AFP Erin Westgate, co-autora do estudo.
“A nossa obsessão com os smartphones e
os ecrãs poderá antes ser o sintoma de um problema pré-existente [o
facto de ser difícil ficar sem fazer nada] do que a causa do problema”,
sugere esta cientista.
A introspecção, a meditação e a solidão têm
sido regularmente praticadas ao longo da História, lembra Erin
Westgate, citando Jesus, Maomé e Buda, mas “talvez se trate de um
chamamento e não de algo nos vem naturalmente ou facilmente”.
Seja
como for, a questão já gerou debate. Uma outra psicóloga, que não
participou no estudo - Sherrie Bourg Carter, do Instituto de Ciências do
Comportamento e da Lei (EUA), considera que “a sociedade recompensa
aqueles que fazem várias coisas ao mesmo tempo” com os tablets e os smartphones.
“As
pessoas começam a sentir-se menos incitadas a marcar tempos de ‘pausa’
ou a desempenhar uma única actividade de cada vez”, disse esta
especialista à AFP.